“Malévola” é um livro de capa bonita, mas sem conteúdo
Crítica de Armando Saullo
Os vilões são parte fundamental de uma história e, por muitas vezes, acabam roubando a cena e virando os protagonistas. A Disney resolveu renovar o clássico “A Bela Adormecida”, trazendo a história em ‘live motion’ pelo ponto de vista da Malévola. A proposta chamou a atenção, já que o estúdio está em fase de estudos e pesquisas sobre esse novo mercado de consumo. As crianças hoje são diferentes das crianças de 1959, ano em que a animação original estreava e fazia história – foi o primeiro longa-metragem animado a ser filmado em 70mm com aproveitamento integral do formato widescreen.
Hoje, era do 3D e IMAX, a nova roupagem aproveita ao máximo os recursos digitais, quase 80% das cenas foram rodadas em fundo verde (cromaqui). É claro que é preciso fazer cinema para essa geração, acostumada com gráficos de videogame e personagens virtuais, mesmo que isso incomode os pais e o público adulto que também vão às salas. O universo mágico onde vive Malévola, o The Moors, é totalmente construído por computação, quase uma Pandora infantilizada (o universo de “Avatar”, que inclusive foi criado com a ajuda do diretor deste filme, Robert Stromberg). Saudades da época de diretores de arte como Michael Seymour (criador do “Alien”) e John Bell (“Jurassic Park”) – ambos ganhadores do Oscar por seus trabalhos incrivelmente realistas e a mistura de computação com robôs. Mesmo exagerando no digital, não se pode dizer que o visual é o problema de “Malévola”. A produção é bonita, bem feita, e tem uma ótima fotografia do australiano Dean Semler. Mas isso não é nenhuma surpresa: a Disney entregou o filme nas mãos de Stromberg, seu primeiro longa como diretor, justamente apostando em seu trabalho já conceituado como supervisor de efeitos especiais. E nisso ele é bem sucedido, tanto que o cineasta já levou o Oscar duas vezes por “Alice no País das Maravilhas” e “Avatar”, que citei anteriormente. Mesmo que os tempos sejam outros, é preciso de mais que um deslumbrante visual para se fazer cinema.
“Malévola” peca justamente onde todos esperavam que fosse inovar, no roteiro. Linda Woolverton (“Rei Leão”, “A Bela e a Fera”) não foi feliz no desenvolvimento de nenhum personagem. Nem a protagonista tem seu merecido ênfase: se perde tanto tempo na espera pelos 16 anos de Aurora, que não se explora bem a infância da personagem e nem a sua transformação de caráter, representada apenas por uma mudança de roupa e uma atuação canastrona. O meio da história fica tão arrastado, que na meia hora final se transforma em uma corrida no tempo para chegar ao grande clímax. No fim, a moral da história tem sua merecida e aguardada “renovada”, mas deixa a desejar ao desmistificar a antagonista. Todo vilão tem seu lado fraco, mas aqui se peca ao exagerar na exposição da fragilidade de “Malévola”.
Exageradamente aclamada pela crítica, Angelina Jolie vai pelo caminho fácil. Sua expressão é quase sempre a mesma, e seus trejeitos de vilã tão elogiados pela imprensa americana não passam de um “carão” de desfile de moda da Victoria Secrets. A sorte de Angelina é seu carisma. Ele está lá, presente o tempo inteiro, e é tão essencial quanto talento em si. A mulher de Brad Pitt cumpre seu papel, mesmo que não acrescente nada interessante ou mesmo relevante a personagem de 1954.
Em suma, “Malévola” inova no visual com um roteiro falho e retrógrado. A vilã aqui é apenas uma mulher traída, que muda completamente o rumo de sua vida, de todo seu reino e até seu caráter por causa disso e depois se arrepende. Opa, já vi isso em algum lugar… Ah, sim! O nome disso é TPM! Afinal de contas, a “Malévola” não é tão diferente de qualquer outra mulher… “Well, Well, Well”…